segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Daqueles dias


Tenho-me aguentado bem. À tona da água. Tenho sobrevivido à maratona de estudo que tem sido este último ano (sim, já estou a estudar há um ano para este exame). E quando digo isto a alguém a resposta é sempre uma variante de um encolher de ombros acompanhado por um sorriso encorajador que me diz "vais ter uma ganda nota, já sabes tudo". Como se qualquer preocupação minha fosse desprovida de qualquer fundamento. 
Não sei tudo. Estou longe de saber tudo. E quem está de fora não percebe, por mais que tente, que apesar de estar a estudar há um ano para isto não tenho sequer garantias de me conseguir manter à tona da água. Porque este não é um exame normal. De todo! Por exemplo, num exame normal se estiverem indecisos entre duas alíneas têm 50% de probabilidade de acertar, certo? Pois neste têm 90% de errar. Ou eu tenho. Foi assim que me aconteceu quando ontem decidi fazer o exame de há dois anos. Se calhar o problema é meu e não do exame. Deu-me agora para a burrice. Ou para a extrema falta de sorte.
Há dias assim. Em que me apetece esquecer isto tudo. Eu sou tão feliz no sofá a namorar e a ver umas séries. Ou a viajar. Bolas, sou tão feliz só no ginásio a fazer uma aulita de zumba. E quando consigo combinar coisas com os meus amigos... nem precisa de ser nada de especial. Na realidade sou feliz com pequenos momentos de estupidez. 
Há dias em que me pergunto o porquê deste esforço se, feitas as contas, talvez não faça assim tanta diferença no final. O porquê de sentir necessidade de provar a mim própria (e aos outros) que consigo mais, que consigo melhor.
Mas depois passa. Tem de passar. E amanhã já é outro dia. E já só ficam a faltar 37 dias para eu ter a minha vida de volta.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Do concerto de ontem

Ontem fui ao concerto do Anselmo Ralph às Festas do Mar.
Já não me lembro quando foi o último ano em que não fui ao último dia destas festas. E por isso mesmo, apesar de não ser a maior fã do Anselmo, acabei por ir pelo convívio, pelo fogo de artifício (que adoro), e já agora porque a cavalo dado não se olha o dente (porque pagar para ir ver o Anselmo Ralph já me custava, mas assim de graça pareceu-me bem).
Chegámos em cima da hora do concerto e o grupo acabou por se separar no meio da multidão. Nunca tinha visto a baía assim. Nada que não estivessemos já à espera. Tinha-se antecipado que lá estivessem 90.000 pessoas. Não deve ter andado longe disso.
Tinha lido sobre o "meet", e por isso estava alerta. O concerto foi bom, não me senti minimamente insegura enquanto lá estive (senti-me como uma sardinha em lata, mas segura) e tive o bom senso de me pôr a andar dali para fora quando comecei a achar que os ânimos se estavam a exaltar e que podiam começar a haver problemas. À saída da baía cruzámo-nos com a polícia de intervenção (havia MUITA polícia nas festas, ao contrário do que já ouvi nas notícias) e acabámos por decidir ir mesmo para casa ainda antes do fogo de artifício por precaução.
Agora vamos àquilo que me impressionou verdadeiramente. Não foi o facto de a baía estar tão cheia (já sabia, foi noticiado a semana toda que esperavam 90.000 pessoas). Não foi o  terem havido desacatos e ter havido pessoal a levar facadas (já sabia que ia acontecer. Aliás, assim que estacionámos o carro disse ao Namorado que teria sido um dia excelente para fazer urgência de cirurgia no Hospital de Cascais porque de certeza que ia haver muita coisa para fazer, inclusivé facadas. Não me enganei).
Aquilo que me surpreendeu foi a quantidade de crianças que lá estavam. E quando digo crianças não estou a falar das miúdas e dos miúdos de 13 anos que acham que já são crescidos e que vão sair à noite ao concerto sozinhos. Estou a falar de crianças pequenas. Bebés. 2 anos. 3 anos. Até passou uma senhora à minha frente no meio da confusão com um bebé ao colo que não teria mais de 3 meses. A minha pergunta é: O que é que passa na cabeça destes pais? O que é que leva adultos teoricamente responsáveis a levarem bebés de colo a um concerto com 90.000 pessoas onde se prevê que venha a haver confusão? Ainda por cima a furarem entre a multidão com miúdos ao colo! Que eles queiram ir e não se importem de arriscar eu percebo. Eu fiz o mesmo. Acreditei (talvez ingenuamente) que por estar "em casa" saberia sempre como me desenrascar se as coisas dessem para o torto. Mas jamais levaria uma criança comigo. Muito menos um bebé.
Há gente louca. E que bate a pontos os tipos do "meet".

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

"Obrigada"

É de graça

quinta-feira, 31 de julho de 2014

É preciso ter uma lata assim a atirar para o tamanho de um garrafão

Estava eu a estudar (qualquer post que eu escreva até  Novembro poderá ter este início), quando recebi uma mensagem da irmã de um amigo meu.
- Olá Princesa! Estás boa?
Estranhei. Basicamente falamos 1 vez por ano, nos aniversários do I. A rapariga é simpática e efectivamente até já nos cruzámos no hospital, ela como doente, e por ser irmã do I. acabei por ir lá visitá-la algumas vezes (dado que tinha doentes meus no quarto ao lado e era até quase mal educado não ir lá).
Respondi que sim, que estava tudo bem, e perguntei-lhe como estava.
- Tudo óptimo! Já sei que somos vizinhas agora! Estou a morar ali ao pé daquele-sítio-que-é-mesmo-ao-pé-da-minha-casa-e-que-não-interessa-agora-para-a-história.
Disse-lhe que já sabia, que o I. já me tinha dito, e perguntei-lhe se estava a gostar da casa nova.
- Muito mesmo! A ver se vamos beber um refresco um dia destes. E assim ficas a conhecer a nossa casa:)
Estranhei ainda mais. Conhecer a casa? Mas porquê? Não conheço a casa do I. sequer... Comecei logo a pensar no tempo de estudo que ia perder. Ir a casa dela... Para quê? A parte do refresco ainda podia ser assim rapidinho. À hora do lanche iamos ao café-que-há-ali-ao-pé-da-casa-dela e tratava-se disso. Agora... Ir a casa? Conhecer a casa? Ficar no sofá à conversa sobre temas banais (porque é o que se pode falar com uma pessoa com quem estás 1 vez por ano num jantar) enquanto podia (e devia) estar a estudar?
Eu faço as minhas pausas, claro. Ainda agora estou a fazer uma para escrever este post, mas gosto de as fazer com actividades que me dêem efectivamente algum prazer. Ir a casa das pessoas de quem realmente gosto.
- Linda, eu sei que até parece mal, mas quero fazer-te um pedido, podes dizer não na boa, não levo a mal de todo... Podes passar um atestado ao meu marido para tirar a carta de mota? Temos o impresso.
Sorri. Menos mau. Assim custa-me menos nunca marcar essa visita à casa nova. Não. Não passo. Claro que não passo. A começar, porque não posso. Não tenho autonomia para passar atestados, receitas ou o que quer que seja durante 2 anos. E depois, também não me apetece. É preciso ter cá uma lata...
Quem me conhece sabe que ajudo sempre no que posso, que estou disponível para ajudar com tudo o que esteja dentro das minhas capacidades e limitações.
Agora... que raio de abordagem é esta???
Sim, depois combina-se um dia para eu ir lá a casa. Quando eu tiver tempo. De qualquer forma a minha visita lá a casa agora já não teria assim tanto interesse. Ninguém fica muito chateado por isso nunca vir a acontecer...



terça-feira, 1 de julho de 2014

Acabou

Eram 8:40 quando cheguei à enfermaria nesse dia. Fui a primeira.
Sentei-me num dos computadores e fui fazer o meu plano diário dos doentes da nossa tira.
Tínhamos um doente novo. Li os registos da urgência: "emagrecimento progressivo (...) cansaço (...) fumador (...) tosse (...) TC tórax: massa pulmão direito com atingimento do brônquio inferior e médio. Imagens compatíveis com metastases em ambos os pulmões.(...) Internado para investigação de massa pulmonar. Provável neo do pulmão com metastases ipsi e contralaterais".
O meu primeiro pensamento foi: Outro.
Tive cerca de uma dezena de doentes neste estágio internados com cancro do pulmão. Todos eles em estadios avançados na altura do diagnóstico.
Fiz o resto do plano e entretanto chegou o G. Contei-lhe do nosso doente novo.
- Outro???? Mas o que é que se anda a passar com esta gente??
Expliquei-lhe que, tal como os outros, era um grande fumador. Tal como quase todos os outros tinha deixado de fumar há uns dias. É um lugar comum. Quando os doente com queixas pulmonares deixam de fumar assim de um dia para o outro já sei que é porque não vem daí coisa boa. É preciso estarem a começar a desesperar.
Ficou o G. responsável por ele e eu fui à minha vida, ver os meus doentes.
Era cerca de uma da tarde quando uma senhora bateu à porta da sala dos médicos, olhou para mim e disse:
- Olá Joana!!! Então, por aqui agora? Nem acredito que já é médica! Está tudo bem consigo?
Não me lembrava da cara dela. Ela percebeu isso. Cumprimentei de um modo educado, disse que sim, que estava mesmo a acabar o curso, faltavam só umas 3 semanas, que estava tudo bem. Disse-me que era mãe de um amigo do meu irmão, lá do colégio, o MM, o melhor amigo dele da infantil (como é que me havia de lembrar??). Lá fiz o click e percebi com quem estava a falar.
Depois de uns 5 minutos de conversa, de saber como estavam os miúdos e de ela se pôr a par das coisas cá por casa lá perguntei o óbvio:
- Veio visitar quem?
- O meu marido.
(Pensei que não devia ser nosso doente, já que nunca tinha visto a senhora antes por ali).
- Está no primeiro quarto.
Senti um arrepio. Ainda perguntei a medo se era o senhor da segunda cama. Era o da primeira. Chamei o G. para vir dar informações. Podia ter sido eu a dar. Em qualquer outro caso teria sido eu porque já sabia a história do doente de trás para a frente e não tínhamos ainda grandes novidades a acrescentar ao que tinha sido observado na urgência. Ele estranhou que o tivesse chamado e depois fez a conversa do costume. Afinal devia ser o nosso décimo doente assim em 3 meses.
- (...) Tem uma massa no pulmão. Só depois de fazermos mais exames é que podemos saber o que é.
No acto de dar notícias más uma coisa importante é percebermos até onde é que as pessoas querem saber e fraccionarmos aquilo que passamos ao longo das várias conversas.
Combinei com o G que este doente seria sempre da responsabilidade dele e não minha por eu conhecer a família. Ele concordou. Contudo todos os dias fui vê-lo e todos os dias falei com a esposa. Mais à frente acabei por ser eu a dizer o resultado da biópsia (era cancro de facto) e o resultado da TC de crânio. Metástases cerebrais.
Acabámos por lhe dar alta referenciado a consulta de oncologia pneumológica num outro hospital. Afinal já não tínhamos mais nada para lhe oferecer ali. E o senhor só me dizia que queria era ir fazer surf. Outra característica dos doentes oncológicos. Queria aproveitar a vida.
Entretanto acabei o meu estágio e transformei-me em médica a sério. Soube que mais tarde foi reinternado lá no hospital num outro serviço e soube depois pelo facebook do filho que tinha falecido. Expectável. É uma espécie de castigo para os fumadores. Cerca de 10 em três meses de estágio. Todos eles fumadores. Ele já cá não está, mas ficaram a mulher e os filhos. Já são crescidos de facto, mas o antigo colega do meu irmão é da idade dele e eu sei que o meu irmão ainda precisa muito de um pai, apesar dos seus 20 anos. O castigo não deveria ser para eles.
Por isso peço-vos. Pensem bem no que andam a fazer (querida Incógnita, pensei muito em si a escrever este texto). E parem de fumar, antes que seja tarde.

terça-feira, 20 de maio de 2014

Do último estágio (ou de como a minha cabeça funciona de maneira mais estranha ainda quando durmo)

Hoje sonhei que estava uma esteticista a fazer-me a depilação... no meio de um consultório médico... porque os doentes tinham de continuar a ser vistos e eu não podia sair. E enquanto a minha chefe de equipa fazia a consulta ia-me fazendo perguntas às quais eu respondia enquanto me arrancavam a cera do buço. E ia dizendo: "Olha, isto por acaso até calha mesmo bem porque quando estiveres a estudar para o Harrison vais lembrar-te deste caso e vais ser muito mais fácil de decorares as coisas".
É basicamente este o ponto de situação deste último estágio.

quinta-feira, 17 de abril de 2014

Um dia vou ter saudades

Um dia vou ter saudades de que os doentes me tratem por "menina". Isto porque quero acreditar que mais cedo ou mais tarde isso vai acontecer...